sábado, 7 de março de 2009

Isto vai de mal a pior

A crisezinha, sabe? Pois eu não percebo a confusão à volta da crise. Estamos em crise desde que me lembro. O que importa são outras coisas. Quer exemplos? Olhe, o futuro da segurança social, por exemplo. A vizinha tem a certeza de que vai ter reforma? Eu não tenho certeza de nada. Zero. O meu Manel fez umas coisas de poupança, umas coisas muito avançadas e seguras diz ele. Eu cá só me apetecia colocar o dinheirinho na Caixa Geral de Depósitos, mas qualquer dia não há lá nada, não é? Tanta ajuda a este a outro banco, de onde vem o dinheiro afinal? Eu não entendo nada, nunca entendi. A minha filha fez uma licenciatura numa universidade privada, esfolou-se a trabalhar e agora diz que precisa de fazer mestrado e depois doutoramento. Caso contrário não é ninguém. Diz ela que uma licenciatura é hoje o equivalente à quarta classe. Claro que ela é que sabe, estuda e lê muito, tem o computador e essas coisas, mas a gente fica a pensar não é? Com a idade dela, já eu tinha saído de casa há quase dez anos. Parece uma coisa incrível. Dizem que os filhos saem cada vez mais tarde de casa. Tomara. Coitados. Então, vão para onde? As casas têm uns preços ridículos, tudo custa para cima de uma fortuna. Mais vale ficarem em casa dos pais e das mães, sempre está tudo montado, máquinas e assim. O que custa montar uma casa, a vizinha já imaginou? No outro dia fiz contas por alto com a minha Isabel e, digo-lhe já, ou ela casa com um homem rico ou então vai viver aqui até o pai se reformar. E a reforma ainda deve ter de dar para pagar o tal doutoramento. Digo eu. Sabe o que lhe digo? Estou cansada de tudo isto. Não vejo melhoras. Cada vez que ligo a televisão e vejo o telejornal só tenho vontade de lhes chamar nomes. Políticos engravatados em carros com motorista. Quem paga aquilo tudo? Nós, com certeza. Este ano não vou votar. Nem que o Partido me obrigue. Essa coisa do comunismo também já não tem jeito nenhum. As saudades que eu tenho de uma boa sardinhada na Festa do Avante e do camarada Cunhal. Eram outros tempos. O meu Manel diz que vota no Bloco de Esquerda, mas eu nem pensar. O Louçã parece o padre lá da aldeia. Muita parra pouca uva, é o que é.
(crónica publicada no Semanário Económico de 7 de Março 2009)